“A prosa de Renato Zapata é traiçoeira. Seu narrador, nada confiável. Quando embarcamos no pincel, ele vai e nos tira a escada, dizendo: agora voa. Embalados, embarcados, voamos mesmo. Mas se pensarmos, de início, que em
Ensaio paralelo voa a história de uma conquista amorosa, cairemos novamente em mais uma de suas armadilhas, sempre erguidas de bem trabalhada linguagem.Em pontos estratégicos da narrativa ouvimos uma espécie de clique. É o sentido se dando pela via de uma poética irresistível, o que nos faz suspender a respiração. Com “a televisão blefava”, “as risadas se espatifavam pelo ambiente”, “a semelhança era um complô”, faz-se a alma da melhor poesia. Esses núcleos de inflexão estão espalhados por todo o livro e fazem de
Ensaio paralelo uma espécie de poema longo.Súbito, mais uma vez sem a escada — eu avisei que não se podia confiar no narrador —, estamos numa São Paulo meio Adoniran Barbosa, meio acampamento de sem-tetos, e no idílio de uma locação tradicional de cinema nos vemos em outro contexto, político, agora não mais subjacente. Será a cidade narrando? O leitor, tomado de assalto, pensa, esse teatro pode desabar a qualquer momento, sobre o que mesmo é essa história?
Sobre aborto? Sobre uma companhia teatral morta? Sobre a favela incendiada? Sobre uma manifestação popular? Sobre ditadura ou sobre exclusão? Sobre coletividade ou sobre violência policial? Sobre sonambulismo ou voyeurismo? Sobre gentrificação ou sobre novas formas de insubordinação?
E o que está em jogo é tudo isso junto: emerge desse caos um Brasil marcado pra morrer, devastado por sua própria impossibilidade, excluído de si. O argumento denso, entretanto, não pesa. Como numa longa letra de samba, Renato expõe um país cindido ao revelar o mistério que envolve Elias, o protagonista com traços de anti-herói que, intrigados, encarnamos desde a primeira linha.
De uma metáfora a outra, vê-se o Brasil esculpido a finas lixas. Em um cego falando do que enxerga; “um clichê forjado de homem fajutos”; uma trupe de teatro mostrando como se pleiteia a algaravia da vida; pombas como ratos sob o escuro sufocante de um telhado; e um portão de rua particular bloqueando tudo. A linguagem tantas vezes torturante e cruel é a voz de um país girando em falso há séculos sobre um mesmo surrado roteiro. E a estupidez sem hora pra acabar.
Entre o terror inominável e a imensa comédia de erros, a São Paulo do livro está viva, atual: ora para um domingo sangrento, ora para uma manifestação de hipnotizados patos pela avenida Paulista. Qual será o nosso destino? De novo a repetição? Uma coisa Renato deixa muito clara: se nossa memória nos trair, nosso corpo não vai nos deixar esquecer.”
Orelha do livro, por Marcílio GodoiCaracterísticas do eBook
Aqui estão algumas informações técnicas sobre este eBook:
- Autor(a): Renato Zapata
- ASIN: B0BB4VJNJQ
- Idioma: Português
- Tamanho: 705 KB
- Nº de Páginas: 178
- Categoria: Romance
Amostra Grátis do Livro
Faça a leitura online do livro Ensaio Paralelo, escrito por Renato Zapata. Esse é um trecho gratuito disponibilizado pela Amazon, e não infringe os direitos do autor nem da editora.