Lithium: Um veneno na dose certa pode ser remédio

Uma história real. De alguém real. 13 anos de psicoterapia, 11 de terapia medicamentosa e inúmeras mudanças no tratamento e interrupções na psicoterapia. O mais importante é continuar a viver para escrever essas palavras, para ter 4 filhos e ser honesta com quem amo. Era isso que pensei quando achei que fosse morrer, que o lítio tinha subido e por isso caí.

Caí da escada. Parece algo enorme no senso comum, mas foi do último degrau. Naquele momento o sofrimento emocional era tão grande que eu disse que queria que fosse do primeiro degrau. Eu achava que desejava a morte até me deparar com a possibilidade dela.

As palavras não ditas, os sorrisos que não dei, as crianças que não vi crescer… É tudo denso. Mas é o que venho sentindo há quase 14 anos. É o auge de toda uma vida em busca do tal diagnóstico.

Meu nome é Mariana Quaresma e para uma de minhas crianças eu sou uma fada, para outros médica, para alguns aluna, para outros irmã, prima, filha, neta, sobrinha, amiga e tantas outras coisas. O paciente não é só o paciente, ele é o amor da vida de alguém. Frase bonita, mas em resumo a psiquiatria me considera uma paciente com transtorno bipolar tipo I.

Aqueles que dançavam foram julgados por aqueles que não conseguiam ouvir a música. Minha única alucinação foi auditiva e agora me pergunto: o quê é real? Eu ouvi dentro de um avião You Could Be Mine, música que eu andava escutando bastante

Eu dancei no sentido de se dar mal. Meus remédios mudaram e eu ganhei o tal diagnóstico. Nesse exato segundo tomo Aripiprazol 1x ao dia, Lítio 2x ao dia, Sertralina 1x ao dia e o Clonazepam (famigerado Rivotril) antes de dormir. Já terminei meu tour de remédios de hoje. Desde que comecei a usá-los, não posso mais dirigir, mas também acabaram os pensamentos suicidas.

Acho que a morte é realmente um dia que vale a pena ser vivido, mas no dia seguinte a ela me perguntei o que fazer e a resposta foi mudar o mundo, mas primeiro mudar a mim mesma.

Só que eu quero dirigir. Me sinto numa prisão. A minha liberdade era aquele carro vermelho. Então percebi não ser livre. Percebi ser livre na arte. Ao meu redor tenho croquis de moda, colagens inacabadas, aquarelas, desenhos, projetos arquitetônicos sem verba, roupas para criar, outras para consertar… versos

Muitos versos e livros. Porque com a possibilidade do soco e eu nunca desvio dele, veio também a certeza de que essenciais são os livros não escritos. E eu quero muito gritar pro mundo o que tem dentro de mim, mas tudo o que sai é poesia. Então vou continuar a escrever.