HISTÓRIAS DE VIDA DE UM DIPLOMATA

Desde bastante jovem, valorizei muito a união de família e aprendi a cultivar os pequenos presentes que a vida nos dá junto aos familiares, lembrando dos momentos alegres e dos difíceis também. Meu pai adoeceu muito cedo, por isso tive poucos momentos em que pude compartilhar troca de experiências com ele. No início, porque ele sempre se dedicou com muita vontade ao seu trabalho e à ambição de ser alguém, e mais adiante, quando eu já era maior, porque eu quis imitá-lo sendo independente, e foquei no meu desenvolvimento profissional, o que me afastou mais ainda dele.

Quando ele morreu, eu estava no exterior, e voltei a vê-lo junto com meus irmãos e minha mãe, um dia antes de sua morte. Ele estava esperando todos chegarem para partir.

Ganhei o melhor presente da minha vida quando descobri, após seu falecimento e da minha Vovó Maria, que ela havia guardado, espalhadas pela sua casa, as cartas que papai lhe escrevera ao longo de sua carreira diplomática, praticamente todo mês. Eu me recordo desse tempo da minha infância em que via meu pai escrevendo essas cartas, mas nunca imaginava que um dia as leria. Foi através delas que o conheci realmente.

Ele era um homem bom, preocupado com a felicidade da família e buscando sempre o nosso bem–estar. Olhava para o nosso futuro e buscou ajuda para nos amparar nos momentos mais difíceis. Era muito agradecido à minha avó, que fez muito por ele ao longo da vida em que viveram só os dois, pois meus avós só viveram juntos até meu pai completar 8 anos. Ele só voltou a ver o pai quando já aposentado no Brasil em 1977, e nunca mais a família teve contato com meu avô.

Ao mesmo tempo, foi um profissional dedicado e reconhecido pelos seus superiores ao longo de sua carreira diplomática, que foi curta, mas bastante intensa. Suas atividades eram bem amplas e iam desde escrever discursos dos políticos brasileiros que visitavam seu posto no exterior, como coordenar o projeto da construção da chancelaria em Washington D.C., até se dedicar à divulgação de artistas brasileiros no exterior. Mamãe tinha muito orgulho dele. Me lembro que os olhos dela brilhavam quando comentava suas realizações. E sei que ela foi a pessoa que mais sofreu ao vê-lo encerrar tão rápido uma carreira tão bonita.

Era um homem sério, mas ao mesmo tempo bastante sensível. A arte o completava. E isso eu presenciei em determinados momentos da minha vida, mas de forma mais intensa durante minha adolescência em Winnetka, Illinois, onde morávamos quando ele serviu como Cônsul-Geral do Brasil, em Chicago. Lá, enquanto eu cursava o high school, via-o revitalizar novos estilos de quadros de arte moderna.

As cartas não só me ajudaram a conhecê-lo mais profundamente, como também a apreciar, ler e poder refletir sobre a sua visão dos acontecimentos que vivenciamos durante nossa vida no exterior. Ao lê-las, tudo me veio novamente à memória. Guardei-as em arquivo protegido e depois escaneadas, por quase 20 anos. E me perguntava como poderia compartilhar toda essa riqueza de sua vida profissional e artística e da família de Almeida Cunha. Não quis deixar essa riqueza se dissipar, e foi então que surgiu a ideia do livro.