Conversando sobre a vida, a morte e o adoecimento

Todo mundo já adoeceu ou já teve que cuidar de alguém doente. A doença e a morte fazem parte da vida, mas nos surpreendemos quando temos que encarar a doença ou a perspectiva de morte, seja a nossa própria, seja a de alguém querido. É irônico observar que o fato mais conhecido da natureza humana continue sendo um mistério e seja reiteradamente vivido como inédito, toda vez que acontece. Somos obrigados a estar constantemente reinventando a roda. A nossa obstinação em negar a existência da morte e da doença faz com que perdemos uma ótima oportunidade de refletir sobre a nossa vida enquanto ainda estamos saudáveis. A recusa em pensar sobre a nossa finitude faz com que soframos mais do que necessitaríamos, quando finalmente essas situações se apresentam, seja através da nossa própria história, seja pela nossa proximidade com pessoas que amamos e que a estão vivendo. Nós nos condenamos, a nós mesmos e a quem amamos, a uma experiência de doença, e de fim de vida, maculada pela solidão e pelo silêncio.
Neste livro, vou me debruçar em questões ligadas ao comportamento humano. Aqui, elas serão vistas pelo prisma da relação médico-paciente e da forma como as pessoas vivenciam as doenças e a morte. Entretanto, como aprendemos na geografia, todos os rios acabam por desaguar no mar. Da mesma forma, independentemente do lugar por onde começaremos a estudar o comportamento humano, do rio que iremos navegar, no final, acabaremos por nos deparar com as grandes questões humanas: o nascimento, a perda, o amor, o sentido da vida, etc.
Neste processo de navegação que empreenderemos juntos, atravessaremos teorias advindas de diversas disciplinas do conhecimento. Não farei um relato acadêmico, mas sim compartilharei com vocês reflexões, intercalando teoria, relatos autobiográficos e situações que vivi, enquanto médica psiquiatra e professora de psicologia médica da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro, junto com os meus alunos em sala de aula e com os pacientes no hospital. Não me aprofundarei nos autores que já trabalharam com cada um dos temas que serão abordados. Em vez disso, apontarei apenas alguns poucos autores que geralmente são considerados pioneiros. Esta omissão é proposital. Optei por não fazer um estudo exaustivo sobre o tema, mas um texto enxuto, para atingir um público maior. Neste caminho que vamos percorrer juntos, eu vou mostrar como consegui construir, em parceria com os meus pacientes e os meus alunos, uma medicina que fizesse sentido para mim e que fosse mais humana; e como aprendi a conviver com um pouco menos de dor com as questões ligadas à doença, à morte e ao fim de vida. Comecemos então a nossa jornada.