Cinco estrelas: Pequena biblioteca de contos pornográficos

“O casal aparenta ser simpático, dá boa noite, e sentam-se os dois atrás, ela no meio do banco, ele no lado oposto ao meu, de modo que pelo espelho é possível estabelecer contato visual. Seguem as perguntas de praxe: sigo o GPS? Ligo o ar? Preferem alguma rádio? E as respostas, igualmente de praxe: sim, por favor, não, não é preciso, com a janela aberta entra um vento gostoso, pode deixar na que está. Quando o cliente senta atrás, o que ocorre na maioria das vezes, este é todo o diálogo que ocorre. O motorista resigna-se então à sua invisibilidade, como se fosse uma espécie de piloto automático, uma máquina que oferece trajetos. Mas nunca antes havia me sentido tão invisível, e, paradoxalmente, tão presente. O homem era um moreno claro, cabelos um pouco cacheados, com uma roupa alegre, um tanto colorida. Calça listrada de algodão, daquelas de loja indiana, camiseta meio hippie, tie dye. Corpo bem definido, ombros largos, destes cuja autoestima transborda. Eu, um tanto mais magro, um tanto menor, com uma idade tão próxima que não saberia dizer se sou mais velho ou mais novo, senti certa inveja: aquele rapaz deve fazer sucesso com as mulheres. A prova maior disso estava ali, ao lado dele: uma garota ruiva, com uma pele alva, sardas nas bochechas, olhos claros, provavelmente verdes. Um corpo que parecia lutar contra o vestido tomara-que-caia, tão magenta quanto ela, excessivamente justo para um peito farto. Dizer que o trânsito pararia para vê-la atravessar é exagero, mas certo é que ninguém fica indiferente aos cabelos rubros em corpo esbelto, seja por sua raridade, seja pelo contraste de sensualidade e inocência que o conjunto revela. A dúvida, no entanto, me assolou: será ruiva de verdade? Tinha toda a pinta, mas só haveria um modo de descobrir, pensei maliciosamente, contendo um leve riso que a ideia provocou e que fez meus olhos buscarem, no espelho, por suas pernas.”