A cidade insólita

A cidade de Querubim das Missões não existe, ao menos na cartografia oficial. Há quem insista em apontá-la em um ou outro mapa, mas basta conferir de perto para constatar que o ponto indicado não passa da obra de algum inseto, que está cagando e andando para essas discussões acadêmicas. A descoberta de um objeto que remonta à época das Reduções Jesuíticas dá início à corrida pelo ouro em seu território. Haverá, de fato, algum grama do vil metal enterrado no solo Querubinense? Sua mais sólida instituição é o fuxico, elevado a condição de patrimônio cultural do povo querubinense.
Não há em Querubim das Missões maluco algum? Como explicar a construção de um manicômio? Uma comitiva do Tribunal de Contas irá para lá em busca de respostas. Conseguirá o Senhor Prefeito Municipal levar a cabo algum plano para povoar o manicômio a tempo? Uma estátua de Santa Dymphna, protetora dos que sofrem de distúrbios mentais, é enviada ao manicômio da cidade próxima. Escondido em seu pedestal, o anão Bóris espera a ocasião propícia para soltar à rua seus internos, como parte de um plano para sequestrá-los. Um contratempo deixa-o preso no interior da estátua. Valendo-se de seu prodigioso talento para imitações, Bóris dá voz à estátua em busca de ajuda. Logo o manicômio torna-se pequeno para o tamanho da devoção à Santa. Tranferida para uma praça, atrai multidões de peregrinos em busca de consolo espiritual. Bóris entende o sofrimento daqueles romeiros. Vendido quando criança pela mãe a um circo, precisou fugir ao ser acusado de provocar um incêndio criminoso. Levou consigo a certeza de que Antonella, o amor de sua vida, estava envolvida no incêndio. Um dia, em seu esconderijo no pedestal da estátua, Bóris ouve o barulho característico da chegada de um circo. Passado e presente, como irmãos siameses que a mão cirúrgica do tempo logrou separar, fundem-se naquele instante.